11 de novembro de 2011

O acesso dos deficientes visuais à informação e à cultura



Foi no passado dia 12 de Outubro que o Serviço de Leitura para Deficientes Visuais da Biblioteca Municipal de Coimbra organizou a Conferência “Tocar, Ouvir, Sentir – O Acesso dos Deficientes Visuais à Informação e à Cultura”, que contou com casa cheia e uma interacção com a plateia muito interessante.

Começando com a envolvente comunicação da Professora Josélia Neves (investigadora e docente do Instituto Politécnico de Leiria) sobre as novas formas das pessoas deficientes visuais terem acesso à cultura nas suas diversas formas, nomeadamente, a áudio-descrição nas peças de teatro, nos espectáculos de música, nos filmes, nos museus, nas exposições de pintura (técnica do “sound painting”) e de escultura. A Professora Josélia partilhou ainda com a audiência algumas peças em relevo (réplicas em miniatura) construídas propositadamente para serem tocadas e apreciadas de perto apelando aos sentidos para pormenores que não detectamos nas peças originais (como o caso da estátua do Anjo de Portugal ou da Paz em Fátima).

Face ao aparecimento e ao sucesso dos Tablets o crescimento dos eBooks no mercado livreiro é um facto, no entanto, em Portugal este formato está longe da oferta existente noutros países, nomeadamente nos Estados Unidos da América. Foi sobre este tema que o Coordenador do Programa Acesso da UMIC apresentou uma panorâmica da situação actual.

Na América do Norte, em Fevereiro deste ano a venda de eBooks suplantou pela primeira vez a venda de todos os outros formatos tradicionais. Com um crescimento anual na ordem dos 200%, e com tendência para manter ou mesmo aumentar, não só nos países anglo-saxónicos, onde a oferta de títulos é maior, mas também nos mercados que ainda estão a dar os primeiros passos nesta revolução – caso de Portugal, onde a aposta por parte dos grandes grupos editoriais ainda é diminuta.

Foram analisados 3 Livreiros/Editoras Portugueses: a Leya, a Bertrand e a Porto Editora. No início de 2011, a oferta da Leya era, tendo por base o sítio Web da TVI, cerca de 200 títulos. Em Outubro, por análise do catálogo online (http://www.mediabooks.com/), contam-se 845 eBooks disponíveis, ou seja 4 vezes mais. Se observarmos o catálogo online da Bertrand (http://www.bertrand.pt/) constata-se que a oferta de eBooks não chega aos 150 títulos.

Pegando apenas na categoria Romance, aquela que tem maior número de títulos disponíveis em formato eBook, é possível constatar que o Grupo Leya disponibiliza cerca de 11% dos títulos desta categoria em formato eBook (165/1552), enquanto que a Bertrand se fica pelos 0,2% (30/12.167). Contudo, é notório que o negócio da Bertrand online é ainda uma aposta forte no livro impresso, pois tem uma oferta, na categoria Romance, quase 10 vezes superior ao Grupo Leya, ou seja 12.167 títulos contra 1.550.

A Porto Editora está também presente online com a sua loja Wook (http://www.wook.pt/) e a oferta de títulos é em tudo semelhante à existente no sítio Web da Bertrand.

Para além da escassa oferta, também as aplicações, por exemplo da imprensa escrita, deixam a desejar em termos de acessibilidade (ver estudo Os Media Portugueses na Internet).

Na conferência ficou bem patente a enorme potencialidade das novas tecnologias, nomeadamente das base de dados existentes on-line e das obras disponíveis em formatos acessíveis a utilizadores deficientes visuais, no caso da Biblioteca Aberta do Ensino Superior (BAES) para os estudantes com necessidades especiais com acervo de mais de 3.000 títulos em Braille, áudio e texto integral digital. No caso da Biblioteca Sonora da Biblioteca Pública do Município do Porto com mais de 6.000 registos em Braille, áudio e dos quais 500 são em texto integral digital (sendo a passagem do repositório existente em áudio para o formato digital um processo moroso e dispendioso). Salientou-se a preocupação da partilha de informação, entre os serviços produtores, relativamente aos títulos em Braille, áudio e texto integral digital de forma a não se produzirem as mesmas obras e rentabilizar tempo e custo em títulos inéditos nestes formatos.

Uma ferramenta importante e útil para esta prática pode eventualmente passar pelo Registo Nacional de Objectos Digitais (RNOD) gerido pela Biblioteca Nacional.

Foi apresentado o conceito da Tradução Intersemiótica que se baseia em traduzir a visão com outros sentidos.

Abordou-se a questão da leitura e interpretação dos áudio-livros, com o testemunho de leitores locutores que partilharam a sua experiência, nomeadamente no âmbito do Projecto “Livros para os Sentidos, Sentido para os Livros” da Biblioteca Municipal de Coimbra, financiado pela Fundação Gulbenkian e com a participação de locutores voluntários.

Aprofundou-se o tema da adaptação de livros, e foram apresentados exemplos como O Livro Negro das Cores da Bruaá Editora ou a Les Doigts Qui Rêvent que adaptam livros exclusivamente para crianças com deficiência visual.

Testemunhou-se o quão rápido pode ser a leitura em Braille, através de técnicas usadas por uma utilizadora e ex-professora do ensino especial, cega, com uma vasta experiência no método considerado por muitos em desuso nos dias que correm.

A palestra terminou com a visualização do vídeo Out of Sight, que nos mostra uma menina cega descobrindo o seu mundo e a forma como é apreendido pelos outros sentidos que não a visão.

Em jeito de conclusão, hoje em dia o acesso à informação, à cultura e à aquisição de conhecimentos por parte dos deficientes visuais é feito de forma mais facilitada, comparativamente com uma década atrás. Porém, a situação actual ainda não é a desejada, sobretudo por falta de conteúdos adaptados ao nível comercial, que embora nos façam crer que a razão principal são os custos elevados, conclui-se que se trata de uma falta de estratégia num potencial mercado.

Fonte: Programa Acesso da UMIC

(enviado via Rede Solidária) 
mv

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